O Medo do fracasso

Medo é consciência, sensação. Um divisor de águas, algo capaz de nos tirar o chão ou ajudar a fazer coisas incríveis. Seria inútil tornar o medo, vilão da história. Ele, o pseudo tirano, está intimamente conectado à nossa rotina. A questão é, como lidamos com ele.

Milton Glaser – on the fear of failure

O prestigiado designer norte americano, Milton Glaser, possui ideias interessantes sobre o medo do fracasso. Recomendo que veja o vídeo a baixo.

Legendado em PT-BR: https://youtu.be/SViuEssVbqI

Dentre toda a abordagem feita no vídeo, destaco a importância de perceber a natureza do medo e suas características inibidoras. O medo do fracasso está intimamente ligado a autocrítica. Sabemos que eventos externos são o principal fator para que o medo de fracassar se perpetue. Mas o medo é espada de fio duplo.

A natureza do medo

Muitas vezes, medo do fracasso está intimamente conectado à nossa rotina, sendo alimentado todos os dias pelas circunstâncias, meios e fins. É como lidamos com o gosto amargo da derrota e a força que provém da inteligência emocional que determinamos o impacto que o azedume da frustração nos deixa. O mantra da autocrítica precisa ser dito mentalmente todos os dias. É preciso renovar o processo de aceitação daquilo que somos e sabemos.

Sempre acreditei que, por mais que seja contraditório, é preciso existir certo grau de pedantismo para alimentar a segurança pessoal e a certeza do que somos capazes de fazer. Não me interprete mal, leitor. Não acho que sou autossuficiente (um erro grave nessa profissão). Mas quando você sabe que é bom em algo, expõe e prova, a tendência é causar uma sensação de estranheza nas outras pessoas. Ninguém está acostumado a ouvir o coleguinha ter segurança em si mesmo. Não é caso raro, mas em um mundo em que o vitimismo é gourmetizado e valores invertidos, a diferença sempre é vista com olhos tortuosos. Complemento com um excelente podcast do Marca de Valor que fala sobre autoconfiança.

Mas não confunda segurança pessoal com comodismo. Não é porque você é bom em algo que é o melhor. Sempre há alguém superior. Não viva se comparando com outras pessoas ou irá fracassar. Reafirmar a velha frase, “siga seu próprio caminho”, nunca é demais. Mas, pior que insegurança é acreditar que não há mais nada mais a aprender. Se esse é seu caso, saiba que algo errado está acontecendo com você. O medo é moeda de várias faces. Eis o motivo pelo qual introduzi aceitação e segurança.

O medo é um processo que nos faz perceber que não somos tão bons como pensávamos. É ele que, graciosamente, tira nosso chão, invade nossos sentimentos mais íntimos e nos desestrutura. É preciso amá-lo. E não pense que será fácil. Não importa quanto o supere. Vez ou outra você sempre será pego de surpresa. Acontece comigo, com você e com todos os mortais. Abrace-o. Você não é o último granulado do docinho.

É importante permitir-se errar para, só assim, alcançar o refino das habilidades. Mesmo que passe toda a existência fazendo as mesmas coisas, conhecimento nunca é demais. Ter ao menos uma noção de como funciona o trabalho das pessoas ao seu redor (leia-se: equipe) é sempre bem vindo.

Segundo Josane Mascarenhas, graduada em Psicologia com ênfase em Clínica Psicanalítica, o medo possui uma raiz mais profunda.

“Para os psicanalistas, o ser humano busca sempre o “princípio do prazer”. No entanto ele se depara com o “princípio da realidade” ao se dar conta que nem todos os seus desejos podem ser realizados.

Esse fato se dá através das relações familiares. Sendo a família o primeiro núcleo social da criança, ele é de fundamental importância quando se estuda o ser humano e sua interação com o meio.

A mãe é a primeira pessoa que o bebê estabelece vínculo. Por um bom tempo, aquele pequeno ser dependerá dela para manter-se vivo. E logo entende que aquela pessoa é importante em sua vida.

Pouco a pouco lhe é mostrado que não se pode fazer, ser ou ter tudo o que se quer. Aquele pequeno ser vai crescer e absorver os valores, crenças e costumes do seu meio de convivência.

Quase sempre a família o pressiona para “ser alguém na vida” e “ser motivo de orgulho”. Essa cobrança ecoa entre os amiguinhos da escola, colegas de faculdade, trabalho, etc.

Isso faz com que muitos tomem atitudes excessivamente competitivas, ou mesmo anti éticas. Faz com que outros se mantenham em comodismos e infelicidades pelo medo da represália social do fracasso.

Quantas vezes desistimos do que realmente almejamos em prol do que parece ser mais aceito aos demais a nossa volta, ou pelo medo de tentar o novo e não dar certo?

Quantos e quantos jovens hoje em dia preferem estudar para concursos e abandonar outros projetos ou mesmo antigos sonhos? Isso se dá pelo medo de arriscar, pelo medo de fracassar. “E o que os outros vão dizer?”, “O que os outros vão achar?” — Pensam muitos deles.

Na verdade, temendo, não apenas o fracasso em si, mas, principalmente a incompreensão e a rejeição daqueles que lhes são importantes. Busca-se sempre pela segurança de não ser castrado dos seu devaneios. Um porto Seguro, sem riscos…

O sujeito teme o fracasso, temendo o princípio da realidade. A dor de que o mundo não é perfeito e que algo pode lhe sair não tão bom assim pra si.”

Essa abordagem reflete o medo que assola a medida que nos tornamos adultos — crescer, às vezes, destrói sonhos. Aos poucos, a rotina e cobrança em vários setores da vida acaba naturalmente inibindo a coragem que tínhamos quando a responsabilidade e o peso da vida adulta não eram tão evidentes. Quando pequenos afagávamos nossas esperanças, anseios e desencantamentos nos braços dos pais. O ninho ainda existe, mas agora, voamos sozinhos.

Você naturalmente pensa, quando adulto, que não vale a pena arriscar sair do ciclo porque as contas para pagar chegam todos os meses. Você se acostuma com a pimenta incômoda do trabalho que te desmotiva e quando percebe, pensa que já é tarde demais para enlouquecer e tentar de novo.

Às vezes, a melhor solução é a mais simples. Não se permitir cansar. Tenha ânimo para recomeçar o tempo todo, seja uma nova empreitada, um novo emprego, mudar de casa, de ramo de atuação, etc. O antônimo do medo é o destemor.

Créditos
Imagem original: Babette Polman (Stockvault)
Revisão: J. Fagner.


Participou desse artigo Josane Silva (Salvador – BA), graduada em Psicologia com ênfase em Clínica Psicanalítica. A Josane gentilmente aceitou meu convite para falar sobre assunto para que pudesse encorpar o artigo. Muito obrigada!

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2 Replies to “O Medo do fracasso”

  1. Guilherme Amarino

    Olá Bella,

    Este artigo me fez lembrar daquela música de JQuest que diz: medo, eu não te escuto mais, você não me leva a nada.
    Por outro lado o fracasso pode nos levar a algum lugar ou até mesmo ao sucesso, desde que usemos os erros/fracassos com o olhar de aprendizado. Dessa forma, os fracassos são importantes para o sucesso mais adiante.

    Ótimo texto, VALEU!

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