Diretor de “Nosso Luto” conta como foi montar peça sobre a morte

Elenco de “Nosso Luto”/ Crédito: Jardel R Fotografia

“O tempo passa, o tempo voa…”

Apesar das diversas inovações, ainda em pleno século XXI, há temas que ainda, independente de tempo e mudanças, seguem como tabus nos mais diversos meios sociais do mundo. Quais seriam? Um deles trata-se da morte. Uma das maiores certezas da humanidade é pouco falada e muito temida pelas pessoas. Afinal, quem não teme pensar na perda de pessoas queridas? Ou então da própria vida?

Quebrando este tabu, o espetáculo Nosso Luto, em cartaz na cidade de São Paulo, no Teatro Ribalta, explora o tema da morte de forma poética e ajuda o público a encará-lo de maneira mais alentadora, sem ater-se a qualquer crença religiosa. Escrita pelo ator, diretor e dramaturgo Kiury, a peça narra o drama da jovem Julieta (Ju Carrega), que tem uma vida reclusa em seu apartamento após o falecimento de alguém muito querido. Mesmo com o passar dos meses e com a força dada pelos amigos Heloísa (Carola Valente), Péricles (Danilo Rodriguez) e o porteiro do seu prédio Sebastião (Sergio Seixas), a garota não consegue aceitar o ocorrido.

A peça traz uma ótima reflexão sobre como lidar com a morte alheia é muito mais fácil do que quando ela nos atinge mais profundamente, quando qualquer palavra ou gesto de consolo parecem insignificantes diante da dor. O elenco bem sintonizado contribui para reforçar a mensagem do espetáculo e explorar a dramaticidade, sem apelar para um peso excessivo, tornando-se assim envolvente do começo ao fim. Rodrigo Ferraz, diretor da peça, concedeu uma entrevista na qual contou sobre o processo de preparação de Nosso Luto. Confira:

Mariana Mascarenhas com o diretor Rodrigo Ferraz

Mariana Mascarenhas: Como surgiu a ideia de dirigir o espetáculo “Nosso Luto”?

Rodrigo Ferraz: Kiury havia me mostrado o texto em fevereiro desse ano de 2017, perguntando se eu tinha interesse em dirigir. Assim que terminei de ler, já estávamos escalando o elenco, tudo foi muito rápido.

Mariana Mascarenhas: Como foi o processo de preparação cênica com o elenco? Os atores encararam com facilidade o desafio de trabalhar com o tema da morte?

Rodrigo Ferraz: A cada cena que lia, já imaginava como ficaria no palco, queria fazer uma peça com o mínimo de detalhes cenográficos possível, para valorizar a atuação de cada ator. Cada um teve uma reação diferente: Sérgio Seixas, por exemplo, que geralmente faz comédia, foi surpreendido com o convite para fazer um drama e adorou o desafio. Danilo Rodriguez queria fazer um texto espiritual, portanto, uniu a fome com a vontade de comer. Já paras as meninas foi natural, como mais um tema…

Mariana Mascarenhas: Você encara o tema da morte ainda como um tabu para ser explorado nos mais diversos aspectos, especialmente no artístico?

Rodrigo Ferraz: Sim, Mariana, um tema delicado, até porque é dolorido para todos a partida de alguém, mesmo se a pessoa for ateia.

Mariana Mascarenhas: O fato do espetáculo tratar do tema de forma poética seria um facilitador para o público lidar com assuntos com os quais têm maior dificuldade?

Rodrigo Ferraz: Facilita sim. Acho que, somado a isso, a delicadeza da atuação dos atores ajuda muito.

Mariana Mascarenhas: E para você? Como foi sua experiência ao lidar com o tema?

Rodrigo Ferraz: Consegui tratar o tema com naturalidade, como mais um. Mesmo sabendo que é algo delicado, eu não poderia dar um foco mais pesado, seria pior para o público, para o elenco, para mim e para toda a equipe.

Mariana Mascarenhas: Como você encara a morte? Já perdeu alguém muito próximo? Como lidou com a perda?

Rodrigo Ferraz: É dolorido para mim também, talvez o fato de acreditar na reencarnação faz doer um pouco menos do que para a maioria que não acredita. Já perdi meus avós quando eu era bem novo, mas também perdi dois amigos especiais demais para mim, e foi dilacerante, mas sei que eles viraram meus anjos da guarda, assim como a Margô, minha primeira cadela, no caso dela, um anjo da guarda quadrúpede.

Mariana Mascarenhas: Apesar de muitas pessoas se incomodarem quando falam sobre a morte, somos bombardeados diariamente com uma avalanche de noticiários ruins, os quais batem recordes de audiência. Produções artísticas que não falam da morte em si, mas mostram violência e assassinato também chamam a atenção. Como se explica esse paradoxo?

Rodrigo Ferraz: Sinceramente não saberia explicar… A cultura não precisa mostrar a realidade sempre, mas muitas vezes mostra, algumas de modo chocante!

Mariana Mascarenhas: Você é adepto de alguma religião? Acreditar, ter alguma fé, ajuda as pessoas a encarar a morte com maior facilidade?

Rodrigo Ferraz: Sou kardecista, de certa forma sim, crer sempre fará bem, independente da religião.

Serviço:

Nosso Luto

Quando: sextas-feiras às 21h, até 30/06/2017

Onde: Teatro Ribalta: Rua Conselheiro Ramalho, 673, Bela Vista

Quanto: 40 reais (inteira) e 20 reais (meia)

Sobre o autor

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Mestra em Ciências Humanas. Jornalista. Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior e em Comunicação Empresarial.
Assessora de Comunicação. Blogueira de Cultura e de Mídias.
Sou apaixonada por programas culturais – principalmente cinema, teatro e exposição – e adoro analisar filmes, peças e mostras que vejo (já assisti a mais de 150 espetáculos teatrais). Também adoro ler e me informar sobre assuntos ligados às mídias de modo geral e produzir conteúdos a respeito.


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