Dois Papas retrata o encontro de duas visões distintas dentro da Igreja Católica
O que, aparentemente, é um encontro entre dois papas retratado no drama dirigido por Fernando Meirelles e escrito por Anthony McCarten com base em sua obra O Papa, vai muito além de um encontro presencial para exaltar o momento em que duas visões completamente distintas na história da Igreja Católica se cruzam pela primeira vez. É assim que podemos definir, ao menos inicialmente, a complexidade e a riqueza de uma conversa fictícia que, embora não tenha ocorrido concretamente, se faz presente na transição de um pontificado para o outro – no caso, do Papa Bento XVI para o Papa Francisco.
É, justamente, o encontro destes dois pontífices o cerne do filme Dois Papas, de Meirelles. A trama narra o momento em que Jorge Bergoglio, então cardeal e arcebispo de Buenos Aires, antes de se tornar o Papa Francisco, viaja para Roma com o intuito de conversar com Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI, para tratar questões relacionadas a sua aposentadoria. No entanto, o que era para ser um simples encontro torna-se uma verdadeira conversa filosófica e reflexiva sobre o tradicionalismo e seu rompimento na Igreja Católica.
Prestes a renunciar, Bento XVI convoca Bergoglio para uma conversa e este, pensando tratar-se apenas do seu pedido de aposentadoria, percebe que o convite é para assumir uma responsabilidade muito maior: a possibilidade de ser o novo Papa, considerando a sua popularidade.
No desenrolar da trama, cada um expõe sua opinião sobre a Igreja Católica explicitando o rompimento que Bergoglio poderia representar – algo que realmente está acontecendo – ao exaltar diversas preocupações com as questões sociais da humanidade e também por visar a resolução de conflitos internos da Igreja.
O encontro entre os protagonistas ganha ainda maior destaque com os recursos cinematográficos trabalhados pelo diretor, que explora vários ângulos de filmagem para ressaltar a intensidade do diálogo, as opiniões contraditórias e o aprendizado extraído de cada um com a conversa. Um dos momentos fundamentais do longa acontece quando Bento XVI começa a mudar algumas ideias conforme conversa com Bergoglio, algo que é explicitado até mesmo nos planos cinematográficos em que aparecem juntos e mais próximos, o que não ocorre enquanto apresentam suas visões distintas.
Outro recurso muito bem explorado por Meirelles são os elementos “ilustrativos” do diálogo entre os protagonistas. Um dos exemplos ocorre na conversa realizada na Capela Sistina, em que o diretor focaliza alguns elementos do famoso afresco de Michelangelo presente na Capela que “ilustram” determinadas reflexões levantadas. Há momentos em que a conversa também é “ilustrada” com cenas do passado de Bergoglio e objetos sacros presentes no Vaticano.
Além do excelente trabalho de direção, é impossível não exaltar a ilustre atuação de Jonathan Pryce no papel de Jorge Bergoglio e de Anthony Hopkins no papel de Joseph Ratzinger. Ambos com um trabalho corporal impecável que parecem materializar os respectivos pontífices na frente das câmeras.
Embora Dois Papas esteja centrado num encontro fictício, ele exibe momentos baseados em fatos reais como a renúncia do Papa Bento XVI, a escolha de Bergoglio como seu sucessor, a ocultação de escândalos cometidos na Igreja Católica, entre outras questões.
Um filme de aspecto poético que não narra uma simples renúncia de um Papa, mas o rompimento de um pensamento milenar para algo inovador, que possa construir pontes dentro da própria Igreja e fora dela.
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Sobre o autor
Mestra em Ciências Humanas. Jornalista. Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior e em Comunicação Empresarial.
Assessora de Comunicação. Blogueira de Cultura e de Mídias.
Sou apaixonada por programas culturais – principalmente cinema, teatro e exposição – e adoro analisar filmes, peças e mostras que vejo (já assisti a mais de 150 espetáculos teatrais). Também adoro ler e me informar sobre assuntos ligados às mídias de modo geral e produzir conteúdos a respeito.