A história de um suicídio (parte IV)

Dois universitários, uma webcam, e uma tragédia.
 
Reportagem de Ian Parker
 

(publicado originalmente na  Revista The New Yorker)

Tradução livre: Luana Werneck

Ravi ia para o colégio dirigindo sua BMW; Clementi não tinha carro. Jane Clementi é enfermeira. E Joseph Clementi dirige o departamento de obras públicas da cidade vizinha Hawthorne. Ele possui outros dois filhos, mais velhos que Tyler, ambos retornaram para casa após terminarem a faculdade, Jane Clementi era membro ativa na Grace Church (Igreja da Graça), congregação local, afiliada à Willow Creek, que era uma grande Igreja, próxima à Chicago.

Mainardi descreveu-os como uma família tranquila. “Ele, diferentemente de meu filho, falava muito,” comentou. Segundo ele, Tyler era o mais quieto dos garotos da redondeza. “Eu o conhecia, mas na verdade não o conhecia, se é que me entende. Ele era muito tímido.”

Joseph Clementi disse-me recentemente que, seu filho era fisicamente franzino, e que se alguém quisesse machucá-lo “ele não teria nenhuma ideia de como se defender”.

Com 1,70m de altura e uma postura ereta, Tyler possuía um cabelo curto e avermelhado, um nariz proeminente, e uma expressão aberta e sincera. Durante sua adolescência, se comportou como um jovem de uma época anterior à dele.

Contribuía com discussões, online, de musicais, óperas e jardinagem e cuidava de rãs anãs africanas. O desktop de seu computador era decorado com imagens de “Fiddler on the Roof” e “Journey’s End”. Costumava perguntar em sites coisas como, “Como devo assar caudas de lagosta?”, “devo colocar óleo de oliva Drizzling sobre eles junto com alecrim?”.

Tyler era muito apegado à sua mãe. Mainardi relembra, “Eu tenho uma foto dos dois parados em frente a ela enquanto ela os abraçava por trás e segurava suas mãos”. Tyler parecia mais feminino do que seus amigos, não tinha nenhum que considerasse como “o melhor amigo.”

Um conhecido que se lembrou de Tyler, escreveu na internet, “Tyler nunca falou ou interagiu muito com o resto do grupo de jovens da Igreja que eu participava com ele”.

Esse post estava acompanhado de uma foto de Clementi em uma excursão que fizera com o grupo da Igreja em 2007. Sentado e olhando para a câmera atrás dele, uma menina ri e passa batom em seus lábios. Ele parecia deslocado, mesmo com sua camisa laranja-brilhante com os dizeres: “Daytona Beach”.

Logo após começar a estudar em Rutgers, Clementi conversou através de mensagens instantâneas [SMS] com alguém que usava o nome de Sam Cruz. A amizade parecia ser bem recente. “Eu amaria ter 3 amigos próximos”, Clementi escreveu para Cruz.

Ele continuou dizendo que, “por eu valorizar a solidão, as pessoas me veem, como se eu sempre quisesse ficar sozinho”, e completou, “mas isso não é verdade… eu preciso de algumas pessoas em minha vida…só não tantas quanto a maioria.” Ele continuou, “EU PRECISO conversar com as pessoas…eu apenas não consigo fazer isso.” Cruz tentou lhe dar um conselho – como começar uma conversa; como perguntar as pessoas sobre elas mesmas. Clementi respondeu, “Eu pesquisei no google um milhão de vezes / Eu conheço todas as regras”.

Clementi era, de fato, um excelente violinista: ele tocava tanto na Bergen Youth Orchestra, como na Ridgewood Symphony, uma orquestra madura. Mas ele não tinha a certeza se possuía o talento e o foco necessário para seguir a carreira de musicista. Com 15 anos, ele se preocupou de fato, com o comprometimento e a prática, e embora alguns colegas da Julliard o tenha encorajado para se inscrever naquela instituição, ele se perguntou “em seu íntimo,” se realmente queria ir.

No último ano, Clementi, havia parado num considerável nível de evolução musical. Na internet, ele se perguntava como escolher entre a Rutgers, a Hartwick ou a Universidade de Connecticut. “Eu não tenho uma baixa atenção para tudo, talvez em biologia, farmacologia ou coisas do gênero,” ele dizia, “Brincando com a ideia de Universidade Comunitária, mas a vontade de ir embora é tentadora demais. Eu me sinto derrotado por HS e odeio a coisa toda”.

Paul Mainardi compartilhou comigo a lembrança de Tyler em uma reunião da família Clementi, a cerca de um ano antes de sua morte. “Ele poderia tocar violino enquanto andava de monociclo”, relembra. “E eu realmente testemunhei isso. Era impressionante”. Enquanto Mainardi se dirigia para casa naquele dia, ele se virou para a esposa e disse: “Uau, quem acreditaria que era o Tyler?”.

Se Clementi tinha uma maturidade acima de sua idade, Ravi possuia um comportamento de adolescente, preocupado com o físico e com a opinião pública. Quando deixou Plainsboro para ir a Rutgers, no outono de 2010, ele escreveu no Twiter mais de duas mil mensagens, duas vezes mais que a maioria de seus amigos ativos. Ele postou vídeos caseiros e centenas de comentários no Bboy, o site de uma danceteria. (quando eu tinha por volta de oito anos de idade eu tentei aprender o movimento do helicóptero… e acidentalmente eu aprendi um movimento em sentido contrário.” Em outros sites, ele postava sua alta pontuação em S.A.T., os seus 2.88 G.P.A., seu longo recorde de saltos e uma foto da sua falsa carteira de motorista de Nova York. Ele comentou no Twiter sobre estar “fora de si”. Pela internet, os escritos de Ravi tendem a ser excepcionalmente cuidadosos com a gramática, e um pouco agressivos com elementos de provocações ou insultos e, às vezes com um pouco de auto-ironia.

Ravi também usou o Formsring, um site que encoraja seus membros a responder às questões postadas por outros membros, cujas identidades podem ser falsas. É um lugar onde os adolescente mostram-se capazes, ou não, para segurar ataques online (Jamey Rodemeyer – um garoto de 14 anos do norte de Nova York, se suicidou em setembro de 2011, depois de contribuir para o arquivo de vídeo do Its Gets Better – tinha lido comentários do Formspring como “Eu não me importaria se você morresse. Ninguém se importaria. Então faça isso.”).

No Formspring, Ravi, com o objetivo de provocar, criou um desafio. A primeira questão, postada de forma anônima, dizia “Porque você é tão viado?” (A resposta: “Porque eu sou inseguro.”) O próximo: “Por que você é tão bicha? (A resposta: “Porque me sinto bem!”) Durante os próximos meses, as perguntas foram:

“Porque você não olha para mim quando fazemos amor?” (“Eu gosto de olhar para mim mesmo”).

“Você ama alguém além de você mesmo?” (“Não”).

“Eu costumava pensar que você era o indiano mais gostoso…então, te conheci melhor”. (“Eu sou bom de cama, independentemente do fato de eu ser ou não um idiota”).

“Com quem você foi no baile de formatura no ano passado?“ “(Eu fui sozinho.”)

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Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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