Não tenho mais idade para militância

Fiquei muito impressionado com a quantidade de panfletagem que chegou até mim nessas últimas semanas. Interessados em ganhar meu voto em favor de seus candidatos, vários amigos me encaminharam seus textos, memes e vídeos de campanha. O detalhe é que, nenhum desses amigos é residente da cidade de São Paulo. Cada um deles, no entanto, acreditava ter melhor noção das necessidades da cidade do que eu que moro aqui há mais de uma década.

São Paulo é o centro econômico do país, mas não era esse o único motivo de tanta agitação. Quem vence a eleição nesta cidade sempre consegue destaque nacional. É sempre uma ótima vitrine, talvez um degrau na subida para a campanha presidencial.

Militantes dos diferentes lados tentaram me convencer de que seus respectivos candidatos eram a melhor opção. As mensagens, de ambos os lados, sempre carregadas de difamações que ultrapassavam o bom senso. Era de se esperar que esses meus amigos soubessem que não sou exatamente uma pessoa mal informada. Na verdade, por causa da minha profissão, tenho mais informações que a maioria deles, além dos meios de apurar.

Mas isso, pouco importa. O que importa é converter novos prosélitos. Como todo recém convertido, o trabalho dessa turma é aumentar o número de adeptos de suas seitas. E volto a dizer, isso acontece em todos os partidos. Se você não percebe o quão insano isso é, provavelmente você é desses que fica fazendo proselitismo pelo seu candidato. Quando algum escândalo for noticiado, você dirá que tudo não passa de difamação da mídia golpista, enquanto você mesmo repassa correntes de WhatsApp cheias de informações que você não tem como verificar. Mas elas são sobre a oposição, então está tudo bem.

DE QUE LADO VOCÊ ESTÁ?

Em seu álbum As Quatro Estações, de 1989, a banda Legião Urbana lançou uma canção intitulada 1965 (Duas Tribos). Em determinado trecho da letra, Renato Russo, muito atento a essa dicotomia,  pergunta:

Estou do lado do bem. E você, de que lado está?


A crítica de Renato é sutil, mas genial (confira este artigo sobre o assunto). Acho meio difícil que alguém admita estar do lado do mal, determinado a prejudicar os outros. E, para não fugir dos meus constantes clichês, posso dizer que, de boa intenção o inferno está cheio.

Há muito tempo evito fazer proselitismo. É um exercício constante e extremamente difícil, mas a recompensa é muito valiosa. Posso criticar quem eu quiser, já que não coloco minha mão no fogo por ninguém. Tenho minhas preferências, mas faço minha parte para que isso não me deixe cego. Quero a liberdade de criticar, principalmente quem eu votei.

Não tenho mais idade para militância.

 

José Fagner Alves Santos

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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