Vai-se Hugo Chávez, fica-se um rombo na economia venezuelana

Depois de 14 anos no poder, o povo venezuelano deu adeus ao seu presidente Hugo Chávez, no último dia 5. Após passar pela quarta cirurgia em Cuba, como parte do tratamento de um câncer que ele desenvolveu há dois anos, Chávez não resistiu a algumas complicações respiratórias e faleceu aos 58 anos de idade.

Com a morte do presidente, seu vice Nicolás Maduro assumiu o posto presidencial e permanecerá no cargo até a convocação das novas eleições presidenciais, que deverão ocorrer em 30 dias. Tanto o governo de Chávez – que lidera e certamente tem a maior probabilidade de continuar no poder – quanto a oposição enfrentarão um verdadeiro abismo econômico, que foi se formando gradativamente e ganhou imenso formato nos últimos anos.

Marcada pela predominância do regime socialista, a Venezuela vem tentando se equilibrar numa corrente econômica desgastada, regida por governos ditatoriais e gestões ultrapassadas, que estacionaram nos tempos de Guerra Fria, sendo altamente exploradas pelo regime capitalista e neoliberal, isoladas do mundo globalizado.

Todavia tal cenário não foi páreo para conter o poderio chavista e sua longa permanência no poder. Basta analisarmos o contexto histórico para entendermos melhor o motivo do desencadeamento deste fator.

Caracterizada como uma economia predominantemente agrícola até o período da Primeira Guerra Mundial, a Venezuela sofreu uma transição econômica que passou a se centrar na extração e exploração petrolífera. Tal atividade passou a ser responsável por 80% das exportações e mais da metade do financiamento da máquina pública. Com a recessão de 1999, o preço internacional do petróleo sofreu uma grande alta, o que contribuiu para alavancar ainda mais a economia venezuelana. Sendo assim, neste ano, quando Chávez foi eleito, a Venezuela era a menina dos olhos para o mercado petrolífero mundial num cenário econômico sustentado pela exportação petrolífera, cuja riqueza gerada era muito mal distribuída e se concentrava nas mãos de uma reduzida elite existente e com a predominância de uma massa paupérrima.

O governo Chávez tinha como plataforma política a conversão de parte dos lucros do petróleo em avanços sociais e optou por reduzir investimentos petrolíferos, direcionando parte do lucro gerado para financiar programas sociais, subsidiando as principais necessidades da massa venezuelana – constituída majoritariamente pelas classes sociais desfavoráveis – conquistando-a cada vez mais e – reduzindo a remessa de divisas para o exterior – contrariando os interesses financeiros o os lucros cada vez maiores das petrolíferas estrangeiras.

Como consequência, com o alimento de cada dia garantido, essa grande massa foi aumentando seu apreço pelo líder venezuelano, o que lhe rendeu dividendos eleitorais, fortalecendo sua permanência no poder, à medida que a oposição se enfraquecia gradativamente.

Tendo maioria absoluta na Câmara, para alcançar seus objetivos e vencer a estrutura de poder das petrolíferas instaladas no país, Chávez optou por uma estratégia de força: desde sua entrada no poder, o ex-presidente populista fechou inúmeras empresas privadas, sem falar no controle imposto sobre toda a imprensa, que teve diversos veículos fechados por publicarem notícias desfavoráveis ao governo chavista – a preocupação em promover uma imagem positivista do país, mesmo que totalmente distorcida da realidade, era o principal foco do ex-presidente em busca de sua eternização no poder.

Todavia, havia uma pressão fortíssima dos países industrializados para a desvalorização da moeda, visando à queda nos preços do “ouro negro”, fazendo com que, no início de 2002, o presidente empossado Pedro Carmona – empresário do petróleo oriundo da Fedecâmaras (Federação das Indústrias da Venezuela) –, por meio de um golpe de estado financiado pelos EUA, que culminou na prisão do presidente eleito Hugo Chávez, alterasse a taxa de juros fixa por um sistema de câmbio flutuante. Tal medida contribuiu para desvalorizar sobremaneira o bolívar, a moeda nacional da Venezuela, e agravar a situação financeira, o que prejudicou a geração de lucros da nação chavista e, consequentemente, a arrecadação proveniente da exportação do petróleo sofreu temporariamente uma considerável redução, mas que favoreceu aos detentores deste monopólio.

Em uma nação cuja economia é praticamente controlada pelo intervencionismo estatal – a diminuição da principal geração de lucro da Venezuela reduziu a produtividade e provocou aumentos inflacionários que se revelaram misteriosos, já que Chávez sempre ocultou os verdadeiros valores das taxas inflacionárias e crescimento do PIB.

Sendo assim, mesmo com a produtividade em baixa e uma necessidade de maiores recursos financeiros para se investir no país, reinvestido do poder após uma revolta da população defronte ao Palácio Miraflores contra o golpe de estado estadunidense, Chávez optou pela redução dos preços no setor de serviços, incluindo o valor do combustível, para não mexer no bolso da população. Resultado: os preços não se elevaram, mas também não houve muitas opções disponíveis de produtos já que, com a redução produtiva e de recursos para importação, formaram-se tremendos buracos nas prateleiras dos mercados, devido à falta de produtos, agravando mais ainda o abismo econômico venezuelano.

Um questionamento que certamente assola a mente de muitos é o porquê, mesmo com toda sua tirania e intervencionismo, Chávez partiu deixando incontável número de venezuelanos que praticamente o idolatravam. A resposta é simples: para uma nação de oposição tão enfraquecida como a Venezuela, em que praticamente a única opção de voto era Hugo Chávez, que soube influenciar e persuadir a mente populacional, não foi nada difícil conquistar tantas pessoas.

Além disso, o ex-presidente ficou conhecido por promover uma certa reversão da situação de acentuada exploração da Venezuela cometida pelos países desenvolvidos como Inglaterra e EUA – que estabeleceram seus poderes hegemônicos sobre diversas nações desfavorecidas e geradoras de petróleo, marcadas por extrema miséria, submetendo os exploradores a situações praticamente escravagistas para gerar pequenos lucros a uma pequena elite dirigente em troca da importação petrolífera.

Ao entrar no poder venezuelano, o movimento chavista foi mudando um pouco, de forma gradativa, essa situação no país ao obrigar as petrolíferas a reverterem 3% da arrecadação em petróleo para ações sociais, reduzindo a desigualdade social, mas ainda sem conseguir reverter o estado de pobreza.

Sem contar que o ex-presidente sempre optou por ajudar a população ao seu modo: oferecer as condições necessárias à maioria esmagadora da população, composta por pessoas menos favorecidas, de modo a não fomentar o crescimento da classe média e alta por meio de investimentos em educação, por exemplo. O motivo: ter o mínimo de sujeitos pensantes e opinativos possíveis, pois quanto mais informados, maior o perigo que representariam ao governo chavista. O sucessor de Chávez que se cuide agora para combater tantos problemas.

Por Mariana da Cruz Mascarenhas

Sobre o autor

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Mestra em Ciências Humanas. Jornalista. Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior e em Comunicação Empresarial.
Assessora de Comunicação. Blogueira de Cultura e de Mídias.
Sou apaixonada por programas culturais – principalmente cinema, teatro e exposição – e adoro analisar filmes, peças e mostras que vejo (já assisti a mais de 150 espetáculos teatrais). Também adoro ler e me informar sobre assuntos ligados às mídias de modo geral e produzir conteúdos a respeito.


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