Um teste sobre a imbecilidade humana

Desde que fui informado sobre a existência da Flat Con Brasil – uma convenção criada para discutir o terraplanismo – tenho me divertido com a criação de piadas sobre o assunto. Comecei a dizer, por exemplo, que 80% do público pagante é composto por jornalistas querendo cobrir tal anomalia; teríamos 10% de pessoas que iriam só para tirar sarro e os 10% restantes seriam compostos por pessoas que realmente acreditam nessa palhaçada.

Apesar de repetir essa história sempre em tom de deboche, eu realmente achava que fazia algum sentido. No alto da minha arrogância eu custava a crer que seres humanos saudáveis, com o mínimo de instrução, realmente pudessem acreditar em tamanha baboseira. Só para dar um exemplo, entre os 12 palestrantes não há um único cientista. São todos produtores de vídeos para o Youtube ou blogueiros. Como alguém pode pagar entre 80 e 120 reais para ir a um evento desses?

Eu sempre achei que essa história da Terra plana não passava de uma grande piada para testar a imbecilidade humana. O fato é que eu fiquei muito espantado ao perceber que, muitas das pessoas que eu conheço levantam dúvidas sobre a esfericidade do planeta e até sobre a existência da gravidade.

Qualquer indivíduo que tenha contato direto com alguém que more no Japão pode esclarecer o problema. Faça uma ligação ou passe uma mensagem de WhatsApp perguntando as horas. Invariavelmente lá será noite quando aqui for dia e vice-versa, a diferença no fuso é de 12h. Tenho certeza que os terraplanistas devem ter alguma explicação mirabolante para tal efeito. Seria mais fácil perceber que o planeta Terra, assim como todos os outros, possui forma esférica. Essa simples concepção resolve um monte de questões de uma só vez. Por exemplo: as estações diferentes entre os hemisférios, as marés, os barcos que desaparecem no horizonte, a sombra da Terra projetada na Lua durante um eclipse, o fuso horário entre Japão e Brasil e tantas outras coisas que não caberiam aqui.

No entanto, essa turma cisma em criar uma explicação mirabolante e falsa para cada evento desses. Eu acredito que essa seja apenas uma forma de aparecer na mídia e conseguir dinheiro. O que tem me impressionado é a quantidade de pessoas aderindo ao credo. Se esse é realmente um experimento para testar a imbecilidade humana, como eu acreditava lá no início, o resultado tem se mostrado impressionante.

 

José Fagner Alves Santos

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


2 Replies to “Um teste sobre a imbecilidade humana”

  1. Alexandre Nagado

    Fala, meu amigo!
    Eu vi uma entrevista de um grupo de terraplanistas no The Noite. Cara, que deprimente! Já vi vídeos do professor Afonso (que ao menos parece ser um cara legal) e li alguns artigos. Aquilo não se sustenta, nunca se sustentou e é uma crença religiosa que os move.
    Vi um psicólogo explicando uma vez sobre um mecanismo mental que faz certas pessoas se apegarem a teorias conspiratórias (plausíveis ou não), pois isso faz com que ela compense suas frustrações presentes com a crença de que é portador de uma informação privilegiada, que os coloca em uma elite intelectual. É uma coisa meio triste, mas que não pode ser tratada como algo inofensivo.
    Eles pregam que o espaço não existe, que acima do domo que protege a Terra existe água. Que o universo não existe, e é apenas água, sendo a Terra um planisfério coberto com um domo criado por Deus. Negam asteróides, cometas, planetas, satélites, viagens espaciais, tudo. Até a Igreja é parte do complô, visto que o Vaticano tem um antigo observatório espacial e há várias crateras lunares com nomes de monges cientistas.

    A explicação para tudo isso está na psicologia, e quanto mais isso se espalha, um monte de outras crenças perigosas vêm a tiracolo. É como eu digo no Twitter: terraplanismo é uma “Redpill estragada”, fazendo alusão à ´pílula do conhecimento proibido de Matrix.

    Abraço!

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