Será que todo jornalista é vendido?

As redes sociais se alimentam de frases de efeito e imagens de impacto, ninguém mais tem tempo para a mínima reflexão

Odeio Facebook. Quem me conhece sabe disso. Aquele ambiente me deixa doente, tenso, mal-humorado, nervoso. Fofocas e boatos sempre existiram, mas essa ferramenta virtual potencializa o boato, eleva exponencialmente o poder de destruição e desinformação. Evitei sempre que pude, mas, por causa da insistência dos amigos – que teimam em argumentar ser mais fácil manter a comunicação por essa rede social – refiz o meu perfil há alguns meses.

Evito ficar bisbilhotando. Deixo para entrar apenas quando recebo alerta – pelo e-mail – de que existe alguma notificação. Infelizmente isso é constante. Quando entro, no entanto, é impossível não ver uma ou outra publicação de algum dos meus amigos.

Eis que, essa semana, dei de cara com um post de um desses meus amigos – um cara que eu conheço desde a infância – fazendo um insulto direto à minha pessoa, ou pelo menos assim interpretei.

A curta postagem desse cidadão dizia que nem todo jornalista é vendido, “alguns são comprados”. Será? O autor da postagem sabe que eu sou jornalista, conhece meu trabalho desde a época em que eu publicava nos jornais de bairro. Pelo jeito, ele não me tem em boa conta.

Para você não dizer que sou extremista, deixa eu esclarecer algumas coisas: o jornalismo é um ofício exercido por seres humanos suscetíveis de falhas, como qualquer outra profissão. Eu mesmo sou testemunha de absurdos cometidos por colegas de ofício. Sei que muitos deles são vendidos, tanto para o partido X quanto para partido Y. Não tenho nenhuma ilusão sobre isso. O problema é generalizar. “Aqueles que não são vendidos são comprados.” Que frase sensacional. E quantos de nós fazem seu trabalho de forma correta? Nenhum? Como ficaria o mundo se a atividade jornalística sessasse por uma semana? Você pode até imaginar que não faria diferença nenhuma, mas faria sim.

A situação da política e da economia mundial só não estão piores porque existem pessoas fiscalizando, vigiando, levando a público tudo que se fala ou faz. Recentemente o congresso nacional resolveu votar algumas pautas no meio da madrugada, na esperança de que não tivesse ninguém olhando. Mas tinha.

É mais fácil colocar a culpa no mensageiro. Se os jornalistas estão levantando pautas sobre coisas erradas que o meu candidato fez é porque nenhum jornalista presta. São todos vendidos ou comprados. Então, me diz onde é que eu pego o meu dinheiro. Até hoje não recebi um único tostão dessa negociação ilegal.

O que vejo é um monte de colegas mudando de profissão para tentar sobreviver. Emprego para jornalista está cada vez mais difícil, e os poucos que conseguem são mal remunerados. Fico me perguntando: excetuando os jornalistas que trabalham na TV, quantos profissionais essa turma conhece? São pessoas que nunca abriram um jornal, que não leem uma revista. Mas todos se acham bem informados pela propaganda partidária publicada nas redes sociais.

Este é o livro dos nossos dias.

José Fagner Alves Santos

 

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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