O sucesso na escrita

De tempos em tempos sou apresentado a alguém que sonha em viver da escrita. Invariavelmente vejo-me obrigado a explicar as complexidades do mercado editorial brasileiro, a quase impossibilidade de se viver apenas escrevendo ficção, a necessidade de se conhecer e dominar relativamente bem os gêneros literários, os benefícios de se cursar uma oficina de escrita criativa etc.

O resultado não poderia ser outro, as pessoas se afastam na mesma velocidade em que apareceram. A maioria me classificando de jornalista fracassado. Na interpretação dessas pessoas, eu destruo seus sonhos porque não consegui realizar os meus. Afinal, Paulo Coelho e mais meia dúzia de escritores brasileiros vivem exclusivamente da escrita. Por que eles não conseguiriam?

Não ligo para essas ruminações. Na verdade, eu até me divirto. No entanto, uma coisa me deixa preocupado: eles parecem não ter a menor noção do campo em que pretendem atuar. As pessoas não querem escrever porque têm algo para dizer, mas porque desejam ficar ricas com a escrita, e isso me soa estranho demais. Pior ainda é perceber o quanto desconhecem das questões burocráticas. Por exemplo: algumas pessoas ficam espantadas quando tento explicar que elas precisam melhorar o conhecimento ortográfico. Não adianta apresentar ao editor um manuscrito com erros gritantes. Uma dessas pessoas chegou a perguntar: “Mas a editora não paga a alguém para fazer a revisão?”.

E tem também a questão da falta de bagagem. O indivíduo lê dois ou três livros do Nicholas Sparks, Nora Roberts, John Green e tutti quanti, e já acha que vai lançar o próximo best seller mundial. É muito bom ter autores que nos inspiram, que nos fazem querer escrever, mas se for para levar a atividade a sério, seria bom conhecer um pouco sobre os gêneros literários existentes, estruturas narrativas, e musicalidade da própria língua.

Recentemente um aspirante a escritor me perguntou “o que são esses ensaios de que você tanto fala? São textos de aquecimento antes de desenvolver o trabalho final?”. Achei muito bom que ele teve a curiosidade de perguntar, mas me espantou que um estudante universitário, quase no final do seu curso, já tendo escrito dois livros engavetados, não conhecesse o gênero do ensaio.

O que dizer então das recomendações de leitura? Eu recomendo: leia Goethe, Machado de Assis, Borges, Cervantes. A cara de insatisfação que recebo em resposta é sempre desanimadora. Para que eles precisam ler Dom Quixote, Os sofrimentos do Jovem Werther ou a História do Guerreiro e da Cativa, se eles podem ler Crepúsculo, Cinquenta tons de cinza ou algo semelhante?

Não se trata da velha discussão entre alta e baixa literatura. A questão é que só se aprende a escrever lendo. O ideal é copiar os grandes mestres, mesmo que se continue a ler a literatura voltada exclusivamente para o entretenimento. É assim que vamos aprendendo a manejar melhor a língua.

Nada disso, é claro, garante sucesso ou dinheiro. A comunidade de pessoas que continua escrevendo, mesmo sabendo que as chances de publicação por uma grande editora são quase nulas, é muito grande. Nós continuamos a escrever porque temos algo a dizer, porque ajuda a cultivar nossa sanidade mental, porque serve de exercício para a organização dos pensamentos, porque faz parte de quem nós somos.

Para muitos, não ter seu trabalho publicado por uma grande editora é sinal de fracasso, para outros, conseguir se expressar de forma compreensiva pela escrita já é uma grande vitória.

A qual grupo você pertence?

 

José Fagner Alves Santos

 

 

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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