Gosto de estar só

 

 

Sempre tive dificuldade para explicar que a solidão me faz bem. Até consigo interagir razoavelmente em grupo, conto piadas quase indecentes, falo mal dos ausentes, discuto política e religião, só não consigo discutir futebol. Mas preciso de um tempo sozinho, para ler, para escrever, para desenhar, para refletir, para ouvir o silêncio. E esse tempo é uma porcentagem considerável do meu dia. Sou um tanto misantropo.

As pessoas que me conhecem há mais tempo já sabem disso – mesmo que tenham dificuldade para entender ou aceitar. Difícil é explicar isso para quem está se aproximando agora. As pessoas se tornam extremamente invasivas por acreditarem que sou tímido. Na verdade, só quero meu espaço.

Namorei por mais de dez anos uma pessoa que insistia em me arrastar para festas de aniversário e churrascos de finais de semana. Invariavelmente, eu era o único que não dançava, que não bebia, que não comia carne. Em resumo, era o chato da festa. Os amigos dela sempre reclamavam do meu comportamento, mas no final de semana seguinte ela me arrastava para mais uma aventura dessas.

Creio que, ainda hoje ela deve acreditar que eu fazia por pirraça. Para algumas pessoas é realmente difícil compreender o diferente. Provavelmente errei bastante com ela também. A namorada atual perguntou recentemente se eu tinha algum traço de autismo, por considerar grosseria a forma direta que tenho de tratar certos temas.

De tempos em tempos novas pessoas se aproximam enquanto algumas se afastam. E tudo começa outra vez. Novamente tenho que explicar que não é timidez, muito menos antipatia. Nem todo mundo acredita nas minhas explicações. Desconfio que esse foi um fator que me prejudicou bastante na carreira de jornalismo. Depois do fechamento do jornal, quando os colegas iam para o bar comemorar, o jornalista, professor e editor Dirceu Fernandes Lopes costumava dizer em tom de brincadeira: “não confio em jornalista que não bebe”.

Boa parte das relações de trabalho, ao menos no jornalismo, são construídas em porta de bar. Nunca fui muito eficiente nessas atividades sociais. Pouco importa ser competente no seu trabalho se você é pouco sociável. Isso posto, até que cheguei longe.

Seja como for, já sou um homem de meia idade. Não conseguiram me dobrar quando jovem, não será agora que irei mudar.

José Fagner Alves Santos

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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