Eu estava errado
Eu, quando jovem, me achava mais inteligente do que era. Talvez seja comum da idade, eu não sei. O fato é que, sempre que eu assimilava um novo conceito – invariavelmente subtraído de algum autor amplamente conhecido –, saía a converter outros incautos no meu círculo de amizades. Entre os 14 e os 18 anos fui adepto do marxismo, mesmo sem entender corretamente o que isso implicava.
Tão logo pude compreender um pouquinho melhor aquela ideologia, corri para os braços de outros autores, quase todos opositores a Karl Marx. Li Max Weber, Friedrich Hayek, Ludwig von Mises e tantos outros pensadores. Eu realmente achava estar descobrindo algo novo. Bem, era novo para mim. Eu realmente não conhecia nada daquilo. Não tinha maturidade para entender metade do que lia. Comecei a me definir como alguém de direita, antimarxista.
Mais um tempo se passou até eu começar a perceber os absurdos que existiam também do outro lado. Se alguns argumentos marxistas eram utópicos, muitos conceitos do liberalismo seguiam o mesmo caminho. A idade e a maturidade foram tirando todas as certezas que eu tinha.
Eu já não acreditava mais neste ou naquele partido, nem no político X ou Y, muito menos em ideologias existentes. Desconfiava de todo mundo. Percebia com maior facilidade os absurdos nos argumentos das diferentes correntes ideológicas (v. Sobre as desavenças do liberalismo).
Havia propostas interessantes em ambos os lados, mas era preciso filtrar o que era pertinente no meio de um monte de ideias absurdas. E não era só isso. Os adeptos das diferentes correntes, com raras exceções, se comportavam de maneira extremamente agressiva, como se estivessem defendendo sua divindade, sua religião.
Comecei a me perguntar se eu havia agido de forma parecida em algum momento da minha vida, é bem possível. A maturidade só vem com o tempo. No fundo, nunca comprei a ideia da utopia socialista; tampouco acreditei que uma “mão invisível” pudesse resolver todos os problemas socioeconômicos mundiais. Eu havia me encantado com parte das ideologias, mas era difícil acreditar no todo. Quando somos jovens é fácil focar apenas no que interessa.
De qualquer modo, cheguei a defender posições que hoje considero absurdas; elogiei pensadores com pautas esdruxulas; fui intolerante com quem pensava diferente; avaliei mal a capacidade de mobilização popular.
Num momento de polarização tão acirrada quanto o atual é difícil admitir que erramos. No entanto, eu errei. Errei ao acreditar na direita, errei ao acreditar na esquerda. As pessoas mais próximas sabem que esse meu posicionamento já vem de alguns anos, mas só agora resolvi trazer a público (v. Escatologia no jogo político).
Não votei no Bolsonaro, que fique claro. Também não votaria no Haddad. Fui contra o impeachment de Dilma (v. O pensamento binário), mas não acredito que o PT seja inocente. Em resumo, sou tão complexo quanto qualquer outro ser humano. É preciso compreender que não dá para simplificar as pessoas do modo como desejam os publicitários políticos. Mas é preciso admitir que o serviço de lavagem cerebral tem sido muito bem executado. Chegamos ao ponto em que os militantes agem de forma automática, como fanáticos de um credo qualquer, e é sobre isso que eu quero conversar com você.
José Fagner Alves Santos
Sobre o autor
José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.