E o Vi FLUMINIS?

Muitos comentários sobre o termo Ipiaú, muitos E-mails e até discussões em outros blogs e sites. Entre todas essas provocações vejo uma em especial do meu amigo Adenivaldo Brito, que apesar de estar cursando letras – salvo engano – é um autodidata em latim.

Ele argumenta que o “Entre rios” citado no texto, é na verdade a tradução do termo em latim “VI FLUMINIS” expresso no brasão da cidade. É verdade, o termo até pode ser traduzido livremente como “entre rios”, mas numa tradução mais literal – todos com os dicionários de latim na mão, por favor! – temos algo levemente distinto:

A palavra FLVMINIS[1] (no latim arcaico não existia a semivogal “U” e em seu lugar era usada a letra “V” como em “CORNVTA CALVIVS EST” ao invés de “CORNUTA CALVIUS EST” (era careca e chifrudo)) realmente deve ser traduzida como rio, mas o termo VI – todos com os dicionários? –é o ablativo de “vis”, que significa “força”. Vi, então, pode significar “pela força”. No caso, “pela força do rio”.

O amigo Adenivaldo só propôs a já citada tradução livre[2] porque não gosta da sonoridade de “O rio das piabas”, ele acha cacofônico. Quanto à confusão dos termos, ele está completamente certo, alguém cometeu o erro e os outros foram repetindo.

Muito obrigado a todos que escreveram – inclusive o amigo Adenivaldo, que em algum idioma desconhecido deveria se chamar Abigobaldo — contribuindo de uma forma ou de outra. Participem sempre e até a próxima.

Fagner Alves

[1] O alfabeto latino primitivo era composto de 21 letras, ou seja, era quase o mesmo alfabeto do português atual, excluindo-se o J, o U e o Z, mas incluindo-se o K. As letras I e V tinham valores ora de consoante, ora de vogal, conforme o contexto fônico do vocábulo. Por exemplo, o I e o V tinham valor de consoante quando vinham precedendo uma vogal, em qualquer posição na palavra. Nos demais casos, tinham valor de vogal. Daí encontrarem-se expressões do tipo: SVB VMBRA ALARVM TVARVM em vez de SUB UMBRA ALARUM TUARUM (Sob a sombra de tuas asas). Mais tarde, lá pelo século XVI, foram incorporados à escrita latina também os sinais J e U, certamente por influência das próprias línguas neolatinas, então já existentes. Este assunto, no entanto, não é ponto pacífico entre os gramáticos.

[2] O amigo Adenivaldo Brito certamente já conhecia a tradução literal, sua citação foi apenas para aludir ao erro inicial que gerou todos os outros e para fomentar o debate.

Post Scriptum: Este texto foi escrito em 2010 e publicado originalmente no extinto blog Segunda Leitura. Os comentários referidos aqui aconteceram no espaço do Segunda Leitura.

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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