As nossas religiões políticas
Ainda sobre essa questão de conferir a veracidade das informações encontradas nas redes sociais antes de compartilhar, publiquei no Portal Café Brasil um post sobre o dogmatismo religioso que está infiltrado no debate político nacional. É provável que esse não seja um problema exclusivamente brasileiro, mas eu prefiro falar daquilo que conheço. Mesmo que isso nem sempre seja possível.
Citei o livro Missa Negra, de John Gray, porque esse é o autor de maior renome – ao menos entre aqueles que eu conheço – falando sobre o assunto. De qualquer modo, é preciso esclarecer alguns detalhes. Esse dualismo entre esquerda e direita, bem e mal, sagrado e profano, não é algo que esteja em toda e qualquer religião, mas é algo muito característico do cristianismo.
É comum lermos por aí que, depois do Iluminismo, houve uma abrupta separação entre fé e ciência. Eu realmente ficaria muito feliz se isso fosse realmente tão simples. O que se vê é que, alguns conceitos que já estavam arraigados no imaginário popular foram reinventados com uma roupagem pseudocientífica.
Tomemos como exemplo essa disputa entre extremistas, liberais ou socialistas. Os primeiros acham que a economia de livre mercado resolverá gradativamente todos os problemas da humanidade; os últimos consideram que o etapismo histórico culminará numa sociedade sem luta de classes. Isso soa, ao menos para mim, como uma solução escatológica, apocalíptica.
E quais seriam os conceitos de apocalipse ou escatologia? Segundo John Gray, “um apocalipse é uma revelação na qual mistérios escritos no céu são revelados no fim dos tempos, e para os Eleitos isto não significa catástrofe, mas salvação”. Isso soa familiar? A ideia de escatologia, por sua vez, é “a doutrina das coisas derradeiras e do fim do mundo (em grego, eschatos significa “último”, “mais remoto”) ”.
A escatologia nem sempre tem caráter positivo: em certas tradições pagãs, o fim do mundo significa morte dos deuses e calamidade final. Mas, dentro do cristianismo, esse seria um caminho irreversível, tal qual as ideias hegelianas e do marxismo ortodoxo do lado da esquerda e das ideias do liberalismo mais extremista do lado da direita. Em resumo, esses movimentos beberam na teologia cristão.
Os hindus e os budistas encaram a vida humana como um momento num ciclo cósmico; a salvação é a libertação desse ciclo infindável. Platão e seus discípulos na Europa pré-cristã encaravam a vida humana praticamente da mesma forma.
Substituíram a ideia de um paraíso celeste pela vida vivida em plenitude aqui na terra. Querem trazer o conceito de juízo final para o debate político/econômico.
Em que pese os excessos do John Gray em determinadas passagens, a reflexão se faz necessária. Mas eu quero saber o que você pensa de tudo isso. Compartilhe sua opinião nos comentários.
José Fagner Alves Santos
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Sobre o autor
José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.