Aprendendo com as revistas

No início de 1999 resolvi passar o verão na casa da minha tia. Ela era assinante da revista Época, uma publicação semanal que havia começado a circular no ano anterior. Esse é um fato curioso, porque nunca a vi folhear os exemplares. Ela pouco se importava com aquelas edições que chegavam à sua porta, sempre às terças. A publicação tratava de cultura, política e atualidades. Eu estava em Salvador, onde minha tia morava, para trabalhar durante o verão. Ela tinha uma fábrica de confecções e resolveu empregar temporariamente uma turma por causa do aumento na demanda.

Acredito que algum bom vendedor tenha passado por lá e oferecido a assinatura. Sem pensar em argumentos que justificassem uma negativa, ela acabou fazendo a assinatura. Mas volto a afirmar que ela nunca abriu uma única edição.

Eu, por outro lado, sempre fui extremamente curioso. Colecionava, já naquela época, a versão brasileira da Wizard – publicação sobre o mercado de histórias em quadrinhos -, a Superinteressante – que trazia curiosidades culturais e científicas com uma linguagem jovem – e mais alguma coisa também voltada para o público adolescente.

Tive uma grande surpresa ao tentar ler os colunistas e as matérias de capa. Percebi que era um universo que eu desconhecia completamente. Ficou claro o tamanho da minha ignorância. Eu não sabia do que eles estavam falando, não entendia a linguagem que usavam. Compreendia uma ou outra coisa, mas sentia que a maior parte eu não absorvia.

Tive a ideia de ler o mesmo texto repetidas vezes. Eu lia e relia até decorar, mas não era esse o meu interesse. O que eu estava procurando era compreender a estrutura textual. Eu sentia que existia uma, mas não conseguia definir. Também queria me apropriar daqueles jargões, daquele ritmo, daquele tom mais sério. Enfiei na cabeça que não ficaria limitado às leituras para jovens, eu precisava compreender o que estava sendo dito ali.

Tive que começar a assistir telejornais diariamente. No começo eu não entendia nada, não ligava o nome à pessoa, não entendia os fatos. Logo comecei a perceber que só aquilo não seria o suficiente. Comecei a estudar história, sociologia, economia, ler os jornais impressos. Aos poucos os textos iam se tornando mais claros. O avanço era bem lento e gradativo.

Eu ainda usava uma velha máquina de escrever, da marca Olivetti, e resolvi copiar os textos que mais me chamavam a atenção. Datilografava palavra por palavra, queria incorporar aquele conhecimento, queria que aquele conhecimento também se tornasse meu.

Quase vinte anos depois, bem aquém do que eu desejava estar, já tenho alguma familiaridade com esse tipo de leitura. Já consigo escrever sobre aqueles assuntos. É muito provável que ainda não tenha a elegância dos autores que eu lia, mas o esforço é diário. Continuo treinando obstinadamente.

Os vários autores que copiei, que imitei, que emulei, ajudaram a formar um pouco daquilo que é o meu próprio estilo. Caso eu tivesse me limitado a copiar uma única fonte, eu seria apenas um doublé medíocre. Ainda hoje aprendo com novos e diferentes autores.

Foi um período longo, de muita dedicação. O retorno financeiro que tenho disso é irrisório, mas não me arrependo. Meu foco nunca foi o financeiro. Eu buscava o aperfeiçoamento pessoal. Hoje, ao reatar contato com alguns amigos que não trilharam o mesmo caminho, fica evidente que não desperdicei meu tempo.

Depois da revista Época, comecei a ler a Veja, Carta Capital, Caros Amigos, Isto É, revista piauí, Bravo e tantas outras que foram compondo minha bagagem.

Sou muito grato a todos esses jornalistas que muito influenciaram na minha formação.

 

José Fagner Alves Santos

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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