Meu Deus!

 
Imagine que você está em sua casa e de repente é surpreendido (a) pela chegada de alguém que, a princípio, aparenta um ser humano comum, mas logo em seguida ele próprio desfaz esta ideia dizendo coisas que você estranha e então se revela ser Deus. Obviamente, a reação natural de muitos, mesmo que acreditem na existência de Deus, será duvidar e achar que o visitante não passa de um louco, porém, conforme Ele vai descrevendo detalhadamente cenas de sua vida desde a infância, você começa a se convencer que está diante do Criador.
 
É assim que acontece em Meu Deus!, comédia teatral elaborada pela escritora israelense Anat Gov (1953 – 2012) e que está em cartaz em São Paulo desde março, no teatro FAAP, com direção de Elias Andreato. Na peça, a atriz Irene Ravache interpreta Ana, uma psicóloga divorciada que mora com seu filho autista (Pedro Cardoso). Num determinado dia Ana está em sua casa reclamando com seu filho da falta de chuva, que ela não vê há tempos, enquanto aguarda pela chegada de um novo paciente misterioso (Dan Stulbach), que não lhe revelou sua identidade ao agendar a consulta.
 
Logo que ele chega, ela acaba assustando-se por não vê-lo entrar. A partir de então dá-se início a um profundo e reflexivo diálogo entre Ana e seu paciente, que não é ninguém menos que o próprio Criador do Universo. Depois de se convencer, com muito custo, de que estava conversando com o próprio Deus, a psicóloga tenta resolver o seu problema, o que não se revela nada fácil: tomado por uma depressão que começou há 2000 anos, Ele está pensando em se suicidar, mas sabe que isso acarretará em uma consequência drástica para toda a humanidade.
 
Em busca de ajuda, Deus vê em Ana a pessoa que pode acudi-lo, porque, como Ele mesmo ressalta, ela nunca foi uma de suas maiores fãs e, na maioria das vezes que mencionava o nome de Deus, era para insultá-lo e culpá-lo pelas suas dificuldades na vida. Apesar de ser uma peça fantasiosa, com uma série de incoerências como o próprio fato de Deus querer se suicidar, o público deve ater-se às mensagens trazidas pelo diálogo entre psicóloga e paciente que acaba levantando uma série de reflexões sobre o comportamento do ser humano na sociedade atual, como o fato dele habituar-se a botar a culpa no Criador para amenizar a gravidade de suas ações.
 
Sendo assim, mesmo tratando-se de uma comédia que em diversos momentos arranca muitas risadas da plateia – especialmente no início, quando Ana se vê totalmente atrapalhada com o inusitado da situação e relata ser difícil conversar com alguém que não teve pai e nem mãe, pois não terá quem culpar pelo comportamento – a peça pode emocionar e despertar reflexões na plateia, como já ressaltado.
 
Tanto Irene Ravache quanto Dan Sutlbach estão muito bem em seus papéis, atingindo a exata sintonia para que o diálogo entre os personagens possa ocorrer de forma tão envolvente neste espetáculo. Tanto que até mesmo o cenário muito bem trabalhado fica em segundo plano, diante da atuação dos experientes atores que se bastam para cativar o público.
 

 

Stulbach, por exemplo, mostra-se extremamente àvontade para interpretar Deus, que ganha contornos bem humanizados, inclusive, ao demonstrar suas fraquezas e indignação com a forma como os humanos se relacionam com Ele sempre para pedir algo, para culpá-lo ou para se lembrarem Dele apenas porque conseguiram o que desejavam. São 80 minutos de espetáculo que passam desapercebidos pela plateia, envolvida com as reflexões e descontrações propostas por Meu Deus!
 
Por Mariana da Cruz Mascarenhas

Sobre o autor

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Mestra em Ciências Humanas. Jornalista. Especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior e em Comunicação Empresarial.
Assessora de Comunicação. Blogueira de Cultura e de Mídias.
Sou apaixonada por programas culturais – principalmente cinema, teatro e exposição – e adoro analisar filmes, peças e mostras que vejo (já assisti a mais de 150 espetáculos teatrais). Também adoro ler e me informar sobre assuntos ligados às mídias de modo geral e produzir conteúdos a respeito.


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