Assuma que os especialistas sabem mais que você

Já não existe espaço para o homem da renascença, aquela figura que transitava com certa habilidade pelos vários campos do saber humano. Hoje a nossa ciência está numa fase tão complexa que é preciso graduação, mestrado e doutorado para adentrar numa área qualquer do conhecimento.

Como não é possível possuir profundos conhecimentos em todas as áreas do saber, somos obrigados a crer naquilo que dizem os especialistas.

O doutorado em determinada área não te habilita a opinar sobre outra. Tampouco existe garantia de que você não vá errar só porque agora se tornou um pesquisador reconhecido. Por isso existe a checagem feita pelos pares. O resultado de uma pesquisa – qualquer que seja – precisa ser publicado, avaliado, discutido, comentado e criticado por outros pesquisadores do mesmo campo. Só depois de passar por todo esse processo os dados terão algum valor.

O método científico não é perfeito, nós sabemos, mas é a melhor ferramenta que temos atualmente. Além disso, ele é continuamente aperfeiçoado e atualizado. Cada nova pesquisa realizada permite aumentar o nível daquilo que conhecemos.

Qualquer um que já passou pelo mestrado ou doutorado sabe do nível de exigência e cuidado durante a redação de um simples artigo. Quanto mais se sobe na pirâmide do mundo acadêmico, maior é a responsabilidade na produção do conhecimento.

Tudo isso parece tautológico, eu sei. Então, por que estou ocupando meu tempo com tais comentários? Simples, caro gafanhoto: existe uma horda de opinadores nas redes sociais que acredita ter o direito de ridicularizar o parecer dos especialistas. Acreditam, inclusive, serem eles os responsáveis por checar as incongruências de tal ou qual parecer. São pessoas que realmente acreditam que suas opiniões estão no mesmo patamar de um parecer científico. Incapazes de compreender o encadeamento lógico e a metodologia aplicada, argumentam possuir opiniões divergentes. E creem refutar, com esse raciocínio pueril, todos os especialistas mundiais.

Seria cômico se não fosse trágico. O resultado da ignorância não é algo bonito de se ver. Nossa ilusão de onipotência e onisciência dificultam a percepção do quanto não sabemos ou do quanto somos frágeis. É o conhecido efeito Dunning-Kruger. Ter honestidade intelectual para admitir suas limitações é coisa para poucos. E falo isso por experiência própria.

Se tal comportamento não fosse perigoso eu poderia ignorar, mas uma informação falsa pode ter um preço muito alto. Todos nós possuímos conhecimento em algumas áreas e ignoramos todo o resto. Por isso consultamos um médico quando estamos doentes, um arquiteto quando precisamos planejar uma construção, um artista quando precisamos unir atividade lúdica e reflexão. Cada pessoa precisa operar dentro das suas respectivas competências, colaborando para o bom funcionamento social. Talvez assim a vida se torne mais suportável.

Interferir em algo que você não tem domínio só porque supõe que exista uma conspiração mundial para desmoralizar seu ídolo, é sintoma de fanatismo. Tome cuidado. A próxima vítima pode ser você.

 

José Fagner Alves Santos

Sobre o autor

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José Fagner Alves Santos é jornalista (MTB 0074945/SP), formado em Letras. Mestre em Educação, Doutor em Literatura. Fã de Ernest Hemingway, Tom Wolfe, Gay Talese, Hunter Thompson, John Hersey e Eliane Brum. Faz um arremedo de jornalismo literário. Publica sempre às segundas aqui no Editoria Livre e apresenta o podcast que é publicado às quartas. Colabora com o Portal Café Brasil.


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